Como falar de dinheiro com as crianças?
Especialistas dizem que quanto mais cedo o assunto ‘dinheiro’ entrar nas conversas de família, melhor. Mas isso tem que acontecer de forma natural, no dia a dia, sem muita formalidade.
“A gente não precisa se sentar na sofá, com hora marcada, para falar de dinheiro. Pode ser em um passeio, assistindo a uma notícia da TV, falando de uma história da escola. Tudo pode ser motivo para falar desse tema sem ficar muito formal”, afirma a educadora financeira Carol Stange.
E como ensinar a lidar com dinheiro? A mesada é um bom caminho?
Sim, a mesada é uma boa maneira para ensinar à criança algumas noções sobre dinheiro: para que serve, é finito e pode ajudar a realizar alguns objetivos se for bem administrado.
“A partir dos 6, 7 anos, a criança pode começar a ganhar pequenas quantias de mesada. É importante estimulá-la a ver o que esse dinheiro pode fazer, que ela pode usá-lo para comprar um picolé, um pirulito. Mas que ela pode usá-lo para alcançar objetivos: se não gastar toda a mesada, se guardar, lá na frente poderá comprar um skate ou outra coisa”, diz Loni.
Esse é o momento também de ensiná-la a se questionar se precisa mesmo gastar a mesada com pequenas bobagens. “Quando ela pedir um brinquedinho, pergunte se ela precisa mesmo. Às vezes, ela quer um videogame, mas a mesada não é suficiente. É o momento de ensinar que se abrir mão daquele brinquedinho, poderá juntar para conseguir o videogame no futuro”, orienta Vinicius Luiz Barreto, planejador financeiro CFP pela Planejar.
Dinheiro ou cartão?
Uma dúvida dos pais é sobre como dar essa mesada para a criança. Precisa ser em dinheiro ou elas já podem lidar com outros meios de pagamento? O C6 Bank (do mesmo grupo controlador do 6 Minutos) acaba de lançar a conta gratuita Yellow, para crianças e jovens. Com essa conta, é possível receber mesada, enviar e receber Pix, e fazer operações com cartão de débito.
Para especialistas, a decisão sobre quando liberar o cartão para o filho deve levar em conta a maturidade financeira da criança ou adolescente. Loni diz que o mais comum é que os cartões comecem a ser introduzidos a partir dos 11 anos, na pré-adolescência. “Essa decisão de dar o cartão vai muito da percepção da família se o filho está preparado para encarar essa responsabilidade”, afirma. “A partir da pré-adolescência, os pais podem fazer um cartão adicional com limite mais baixo.”
Apesar de ter muito adulto pendurado no rotativo do cartão, Loni diz que o cartão não é um vilão. “Eu pago tudo com cartão de crédito. Posso pagar no débito, mas uso o crédito porque tenho benefícios. Não estouro meu limite. Esse é o mesmo raciocínio para o pré-adolescente se fizer o passo-a-passo correto, ele estará pronto para ter um cartão de limite menor, sair, gastar com os amigos. Tudo isso sob controle dos responsáveis”, conta.
Para as muito pequenas, os especialistas dizem que o dinheiro de papel funciona melhor, pois as crianças conseguem visualizá-lo, guardá-lo. “O porquinho continua sendo útil. A criança aprende vivenciando. Ela conhece as notas, sente a textura, vê as carinhas que estão nelas. E se ela gastar tudo, acabou. Aprende que dinheiro acaba”, diz Carol.
Antes de passar para o cartão de débito ou crédito, Carol diz que uma boa ferramenta de aprendizado financeiro é a conta na cantina da escola. “Antes dos 10 anos, é um desafio carregar o cartão, digitar senha. Talvez faça mais sentido começar esse aprendizado pelo cartão da cantina”, diz a educadora. “É um grande início, é o primeiro contato com a administração do orçamento mensal ou semanal. Já vi casos de pai que colocam R$ 40 de crédito por semana e o filho gastou tudo no primeiro dia porque pagou coisas pros coleguinhas da classe. Tem coisas que parecem óbvias, mas não são.”
E como é com os filhos delas?
Carol tem 2 filhos, de 10 e 11 anos. Eles ainda não têm cartão de crédito. “Aqui, eles não têm cartão com limite. Eles têm crédito pré-aprovado para o lanche da escola e recebem uma mesada. Uma parte da mesada vai para a conta digital, que é remunerada, e outra fica na mão deles.”
Loni tem um filho de 17 anos, que passou a usar cartão com limite quando fez 15 anos. “Só ganhou cartão quando teve responsabilidade para ter um.”
E dá para falar de investimento com criança?
Lógico que dá. Carol, por exemplo, diz que conversa sobre ações quando sai com seus filhos. “Quando vamos a um shopping, explico a eles que podemos ser sócios daquele lugar. Estivemos numa rede de lojas e eles foram super críticos ao analisar o lugar, a limpeza, o atendimento, o sistema de vendas.”
Para os menorzinhos, ela diz que esse conceito dá para ser ensinado de forma mais lúdica. “Dá para desenhar uma empresa, separá-la em pedacinhos e ensinar um pouco sobre o que são ações. Não precisa ser nada muito elaborado.
Apesar dos pais poderem dar aos filhos noções de investimento, a responsabilidade pelo direcionamento do dinheiro é dos adultos, nunca do menor de idade. “A criança não pode tomar decisão sozinha. É preciso ter um adulto tomando decisões por ela. Quando ela for maior de idade e começar a gerar renda, aí pode decidir o que fazer com o dinheiro”, diz Loni.
Segundo ela, seu filho já se interessa por investimentos. “Ele ganha a mesada e me pergunta o que pode ser comprado [no mercado] com aquele dinheiro. Juntos, avaliamos as ações, selecionamos e fazemos uma boleta de compras.”
Qual ensinamento não pode faltar?
A primeira coisa é que a mesada não pode ser dada de mão beijada. Ela tem de ser atrelada a alguns combinados, que variam conforme a idade, como bom comportamento, bom desempenho escolar ou realização de tarefas.
Outra coisa é importante é que a criança aprenda que a mesada tem um limite. “Se ela ganhou e gastou tudo antes do mês, os pais vão ter que dizer que o dinheiro acabou e ela vai ter que esperar”, diz Loni.
Segundo ela, a criança tem de aprender que dinheiro não cai do céu. “Papai e mamãe ganham esse dinheirinho com muito suor e sacrifício. Inclusive, os pais se ausentam boa parte do dia para trabalhar e se reúnem à noite para que algo seja construído em prol dessa família.”
Vinícius reforma essa lição. “É importante que a criança reconheça o valor da mesada, que ela cumpra algumas tarefas para recebê-la, para não achar que dinheiro cai do céu. Se ela ganhar sem esforço, não vai dar valor àquele dinheiro. Vai pensar que é fácil ganhá-lo”, diz Vinicius.